Acórdão: Apelação Cível n. 2006.031382-6, de Barra Velha.
Relatora: Desa. Salete Silva Sommariva.
Data da decisão: 15.05.2007.
Publicação: DJSC Eletrônico n. 327, edição de 08.11.2007, p. 88.
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA C/C MANUTENÇÃO DE CLÁUSULA CONTRATUAL REFERENTE AO PAGAMENTO PARCELADO – CERCEAMENTO DE DEFESA – INOCORRÊNCIA.
Não incorre em cerceamento de defesa o julgamento antecipado da lide quando a controvérsia recair sobre matéria passível de solução mediante o simples exame dos documentos carreados aos autos.
COMPRA E VENDA DE IMÓVEL – PAGAMENTO DE SALDO REMANESCENTE – NOTA PROMISSÓRIA DADA EM GARANTIA – PRAZO PARA QUITAÇÃO DO CONTRATO – DATA DE VENCIMENTO DO TÍTULO.
Amparando-se a garantia de contrato de compra e venda em nota promissória contendo a importância total relativa a saldo remanescente, ter-se-á como prazo de vencimento da obrigação aquele constante no título. Pouco importa, no caso, que o pagamento se dê na forma de prestação periódica, bastando que atinja o valor total na data-limite constante na cártula, haja vista que, a partir de então esta passa a ser exigível.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de apelação cível n. 2006.031382-6, da Comarca de Barra Velha (Vara Única), em que é apelante Osvaldo Antonio Machado, e apelado Ricardo Ralfo Hacker:
ACORDAM, em Terceira Câmara de Direito Civil, por votação unânime, negar provimento ao recurso, mantendo-se incólume a decisão desafiada que julgou improcedente o pedido articulado na exordial.
Custas na forma da lei.
I - I - RELATÓRIO:
Osvaldo Antônio Machado ajuizou ação declaratória cumulada com manutenção de cláusula contratual em face de Ricardo Ralfo Hacker, sustentando que, por intermédio de um contrato verbal com a parte ré, adquiriu um imóvel, no valor de R$ 45.000,00 (quarenta e cinco mil reais), pagando no ato da efetivação do negócio a quantia de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), sendo que o saldo de R$ 25.000,00 (vinte e cinco mil reais) seria pago em parcelas mensais de R$ 300,00 (trezentos reais), vencendo-se a primeira em 13.11.2003 e as demais sempre no dia 13 (treze) dos meses subsequentes, uma vez que as prestações seriam pagas pelo Sr. Valmir Lucas Costa, o qual emitiu em garantia uma nota promissória no valor do saldo remanescente.
Aduziu que, na data do vencimento, o réu compareceu perante o Sr. Valmir Lucas Costa, que lhe efetuou o pagamento da parcela convencionada, emitindo o recibo no valor de R$ 300,00 (trezentos reais). Informou que, quatro dia após, em 17.11.2003, a esposa do réu solicitou ao Sr. Valmir Lucas Costa o adiantamento do valor de R$ 600,00 (seiscentos reais), o que naquela oportunidade lhe foi entregue um cheque no valor de R$ 209,00 (duzentos e nove reais), no dia 21.11.2003 outro cheque, no valor de R$ 223,70 (duzentos e vinte e três reais e setenta centavos), e no dia 28.11.2003 mais R$ 200,00 (duzentos reais), totalizando a quantia de R$ 632,70 (seiscentos e trinta e dois reais e setenta centavos), restando pagas as parcelas do mês de dezembro e janeiro de 2004, remanescendo o saldo de R$ 32,70 (trinta e dois reais e setenta centavos) para ser descontado do mês de fevereiro.
Argüiu que, em 19.12.2003, a esposa do réu novamente procurou o Sr. Valmir Lucas Costa, pedindo-lhe mais um adiantamento, oportunidade em que lhe fora entregue um cheque no valor de R$ 425,00 (quatrocentos e vinte e cinco reais), e, desta forma, restando pago o mês de fevereiro integral e permanecendo o saldo de R$ 57,70 (cinqüenta e sete reais e setenta centavos) para abatimento do mês de março.
Salientou que, no dia 04.02.2004, mais uma vez, a esposa do réu recebeu a importância de R$ 424,00 (quatrocentos e vinte e quatro reais), restando pago mês de março de 2004, e remanescendo ainda, para descontar do mês de abril, a quantia de R$ 181,70 (cento e oitenta e um reais e setenta centavos). Afirmou que, no dia 29.03.2001, fora solicitado novo adiantamento, no valor de R$ 810,00 (oitocentos e dez reais), quitando assim, os meses de abril, maio e junho de 2004, restando um saldo para descontar da parcela do mês de julho no valor de R$ 91,70 (noventa e um reais e setenta centavos).
Frisou que, no dia 04.05.2004, o réu compareceu perante o Sr. Valmir Lucas Costa e lhe foi adiantado o valor de R$ 422,00 (quatrocentos e vinte e dois reais) e portanto, as parcelas convencionadas se encontrava quitadas integralmente até o mês de julho de 2004, restando um montante de R$ 213,70 (duzentos e treze reais e setenta centavos), para ser descontado da parcela do mês de agosto de 2004.
Asseverou que, aproximadamente no dia 06.05.2004 ou 07.05.2004, novamente o réu exigiu do Sr. Valmir Lucas Costa valor muito superior ao efetivamente convencionado, oportunidade em que lhe fora negado, uma vez que não se poderia dispor de tamanho montante, continuando a pagar o que fora acordado.
Mencionou que ficou surpreso com a notificação que recebera, e, assim, para resguardar seus direitos, requereu em juízo o depósito das parcelas vincendas, solicitando a abertura da conta poupança judicial, para assim, depositar a parcela referente ao mês de agosto, no valor de R$ 86,30 (oitenta e seis reais e trinta centavos), e, a partir do mês de setembro, no valor integral de R$ 300,00 (trezentos reais), a fim de que não permanecer inadimplente.
Assim, pugnou pela condenação dos réus ao cumprimento do contrato, recebendo os valores conforme combinado e que fosse declarado por sentença a transferência do imóvel para seu nome
Ao final, requereu a procedência do pedido, condenando o ré ao pagamento das custas e honorários advocatícios, e ainda, a eventuais danos que causar, bem como a declaração da obrigação de transferência do imóvel até o prazo de 10 (dez) dias do cumprimento integral do contrato, sob pena de multa pecuniária diária.
Citado, o réu ofereceu resposta na forma de contestação (fls. 30/36), sustentando, em síntese, que: a) em 12.04.2003, adquiriu do Sr. Solano José de Souza, através de contrato verbal, o imóvel em apreço; b) pagou pelo imóvel a importância de R$ 55.000,00 (cinqüenta e cinco mil reais), sendo R$ 30.000,00 (trinta mil reais) de entrada à vista e o saldo de R$ 25.000,00 (vinte e cinco mil reais) seria pago em 16 (dezesseis) parcelas mensais; c) não escriturou o imóvel em seu nome, em face de que, após seis meses vendeu-o ao autor, pelo preço certo e ajustado de R$ 45.000,00 (quarenta e cinco mil reais), recebendo R$ 20.000,00 (vinte mil reais) de entrada à vista, restando o pagamento de R$ 25.000,00 (vinte e cinco mil reais), com vencimento para o dia 25.10.2003; d) recebeu como garantia do pagamento uma nota promissória no valor de R$ 25.000,00 (vinte e cinco mil reais) emitida pelo Sr. Valmir Lucas Costa; d) em 20.05.2003, escriturou o imóvel diretamente para o nome do autor, fato que lhe prejudicou, pois agiu de boa-fé, acreditando na promessa do comprador que lhe pagaria o valor acertado até o dia 25.10.2003, conforme nota promissória emitida; e) diante da falta de pagamento, dirigiu-se diversas vezes ao autor para receber o ajustado, porém, recebeu como forma de pagamento uma porta de madeira no valor de R$ 398,00 (trezentos e noventa e oito reais) e dois cheques no dia 18.03.2004, nos valores de R$ 100,00 (cem reais) e R$ 312,00 (trezentos e doze reais), para serem descontados no dia 15.03.2004; g) o autor deve a importância de R$ 25.0000,00 (vinte e cinco mil reais), sem contar os juros do período, subtraindo-se deste valor a porta e os dois cheques mencionados; h) não há concordância de sua parte com o depósito em juízo, uma vez que o negócio foi feito para pagamento do saldo devedor à vista e não de forma parcelada; i) a transferência do imóvel, assim como o pedido de aplicação de multa diária, não podem prosperar, haja vista que já houve a transferência no dia 20.03.2003.
Ao final, pugnou pela improcedência dos pedidos, condenando-se o autor ao pagamento das custas e honorários advocatícios. Pleiteou, ainda, pelo benefício da justiça gratuita.
Devidamente intimado, o autor deixou transcorrer in albis o prazo para se manifestar acerca da contestação (fl. 57).
Realizada a audiência de conciliação (fl. 65), restou prejudicada a proposta de acordo ante o não comparecimento do autor, ainda que devidamente intimado.
Sentenciando o feito (fls. 76/78), o magistrado a quo julgou improcedente o pedido formulado pelo autor, condenando-o ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, em 20% (vinte por cento) sobre o valor da causa.
Irresignado, a tempo e modo, o autor interpôs recurso de apelação (fls. 101/104), aduzindo que, para provar suas assertivas, era indispensável a inquirição e oitiva das testemunhas arroladas, não podendo o magistrado ter julgado antecipadamente a lide, uma vez que, dessa forma, cerceou seu direito de defesa, requerendo, assim, que fosse declarada nula a sentença.
Alternativamente, pleiteou pela procedência dos pedidos formulados na exordial, uma vez que o recebimento das parcelas pelo apelado comprova a forma de pagamento.
Apresentadas as contra-razões (fls. 118/122), os autos ascenderam a este egrégio Tribunal de Justiça.
II - II - VOTO:
Presentes os pressupostos de admissibilidade, impõe-se o conhecimento do recurso por este órgão julgador, passando-se à análise das questões deduzidas nas respectivas razões recursais
1 Preliminarmente
Do cerceamento de defesa
A apelante defende a tese de cerceamento de defesa diante do julgamento antecipado da lide, haja vista pretender corroborar suas alegações mediante a produção de prova testemunhal, uma vez que estas são indispensáveis para corroborar com os fatos aduzidos na exordial.
Com efeito, tratando-se de questões de fato, vislumbra-se que as provas conduzem o magistrado à formação de seu convencimento, de sorte a autorizar o julgamento antecipado da lide quando se convencer da existência de elementos suficientes à prolação da decisão, visto ser o próprio destinatário das provas, detendo a prerrogativa de ordenar sua produção ou de indeferir aquelas inúteis.
Na hipótese vertente, percebe-se que, o documento de transferência do imóvel (fl. 38), as vias das notas promissórias (fls. 39/47), bem como o título de crédito dado em garantia do saldo restante (fl. 48), se mostraram suficientes ao desfecho da lide, porquanto fornecem todas as informações necessárias para se atestar a real verdade dos fatos e da solução da controvérsia.
A propósito, colhe-se do Superior Tribunal de Justiça:
"(...) Nos termos da reiterada jurisprudência desta Corte Superior, 'a tutela jurisdicional deve ser prestada de modo a conter todos os elementos que possibilitem a compreensão da controvérsia, bem como as razões determinantes de decisão, como limites ao livre convencimento do juiz, que deve formá-lo com base em qualquer dos meios de prova admitidos em direito material, hipótese em que não há que se falar cerceamento de defesa pelo julgamento antecipado da lide' e que 'o magistrado tem o poder-dever de julgar antecipadamente a lide, desprezando a realização de audiência para a produção de prova testemunhal, ao constatar que o acervo documental acostado aos autos possui suficiente força probante para nortear e instruir seu entendimento' (REsp n. 102303/PE, Rel. Min. Vicente Leal, DJ de 17/05/99)" (AgRg no REsp 614221, Rel. Min. José Delgado, j. em 18.05.2004)
Neste sentido, é o entendimento preconizado por esta corte catarinense:
"Não há cerceamento de defesa quando há nos autos elementos bastantes a formar o convencimento do magistrado, permitindo-lhe o julgamento antecipado da lide" (AC n. 2004.010363-8, de Palmitos, Rel. Des. Marcus Tulio Sartorato, j. em 24.09.2004)
Acerca do assunto, colhe-se da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:
"O magistrado tem o poder-dever de julgar antecipadamente a lide, desprezando a realização de audiência para a produção de prova testemunhal, ao constatar que o acervo documental acostado aos autos possui suficiente força probante para nortear e instruir seu entendimento." (REsp 66632/SP, Rel. Min. Vicente Leal, j. em 29.05.2001). (grifou-se).
No caso concreto, a apelante mencionou, unicamente, pretender a produção prova testemunhal para atestar suas alegações.
Ademais, é essencial, e assim se poderia dizer fatal, mencionar que, ao longo da demanda, o apelante mostrou-se relapso, porquanto embora devidamente intimado, este deixou transcorrer o prazo para oferecer réplica a contestação (fl. 57), bem como restou ausente na audiência de conciliação (fl. 65), mostrando assim, seu desinteresse frente à comprovação dos fatos aduzidos na exordial.
Desse modo, não há falar-se em cerceamento de defesa no feito em comento.
2 Do mérito
Da forma de pagamento pactuada
Sustenta o apelante que o recebimento das parcelas pelo apelado, no valor de R$ 300,00 (trezentos reais) e garantidas pela nota promissória emitida pelo Sr. Valmir Lucas Costa, na quantia de R$ 25.000,00 (vinte e cinco mil reais), comprova que este era o pacto avençado entre as partes, não podendo, assim, o apelado, querer alterar a forma de pagamento ajustada por sua livre e espontânea vontade.
Todavia, razão não lhe assiste.
Inicialmente, cumpre destacar que restou incontroverso nos autos (CPC, art. 334, III) o contrato verbal celebrado entre as partes, bem como a emissão da nota promissória data em garantia por terceiro alheio à relação processual.
Desse modo, o cerne da controvérsia reside no fato de se apurar se o saldo remanescente de R$ 25.000,00 (vinte e cinco mil reais) deveria ser quitado sob a forma de prestações mensais, cada qual no valor de R$ 300,00 (trezentos reais), ou se a importância haveria de ser quitada em prestação única.
É fato que os recibos acostados na inicial (fls. 12/13), emitidos pelo próprio apelado e por sua esposa, confirmam o pagamento dos valores ali constantes, de modo a quitar, parcialmente, o saldo remanescente.
Entretanto, o documento de fl. 48 referente à nota promissória dada em garantia no pacto avençado, acostado aos autos pelo apelado, e frisa-se, não impugnado pelo apelante, prova a veracidade das alegações despendidas em sede de contestação (fls. 30/36), confirmando, assim, que o efetivo pagamento do saldo remanescente, ou seja, a segunda parcela, deveria ser paga em cota única até a data de 25.10.2003.
Convém salientar que a relação contratual gera um vínculo entre os pactuantes, de sorte a permanecer o devedor obrigado a cumprir a prestação avençada, nos seus exatos termos, sob pena de incorrer nas conseqüências decorrentes do inadimplemento.
A assertiva supramencionada também se aplica à forma de pagamento constante nos termos contratuais, no sentido de que o devedor permanece obrigado a quitar a dívida nos moldes do ajustado não obstante o credor possa receber prestação diversa daquela devida, caso não haja oposição por parte deste. É o que se dissume o art. 313 do Código Civil, saber, "o credor não é obrigado a receber prestação diversa da que lhe é devida, ainda que mais valiosa."
Nesse sentido é o entendimento de Maria Helena Diniz
"Proibição do "solvere aliud pro alio." A obrigação rege-se pelo princípio fundamental de que o credor não poderá ser obrigado a receber prestação diversa da que lhe é devida, ainda que mais valiosa; logo o devedor, para exonerar-se da obrigação, está adstrito a entregar exatamente o objeto ou a realizar a prestação determinada na convenção. " (Código civil anotado, 11.ed., São Paulo: Saraiva, 2005 p. 325) (grifou-se)
Em casos semelhante ao presente, mutatis mutandis, colhe-se de julgado do Tribunal de Justiça do Distrito Federal:
"ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO CONVERTIDA EM AÇÃO DE DEPÓSITO. OFERTA DE TDA'S EM SUBSTITUIÇÃO DO BEM. RECUSA POR PARTE DO DEPOSITANTE. AÇÃO JULGADA PROCEDENTE. SENTENÇA CONFIRMADA.
O credor de coisa certa não pode ser obrigado a receber outra, ainda que mais valiosa. Julgada procedente a ação de depósito, ao depositário restam dois comandos: fazer a entrega da coisa, ou do equivalente em dinheiro. Conseqüentemente, não há uma terceira via, onde o depositário possa fazer a entrega de outra coisa, como substituta da que foi depositada. Por isto mesmo, a sentença não poderá conter esse comando. É a inteligência que se extrai do art. 863 do Código Civil em consonância com o preceito estampado no art. 904 do Código de Processo Civil." (AC. n. 1998.01.1.006482-6, Rel. Des. Romão Oliveira, j. em 20.10.1999).
Seguindo o raciocínio do legislador, vale transcrever o disposto no art. 314:
"Art. 314. Ainda que a obrigação tenha por objeto prestação divisível, não pode o credor ser obrigado a receber, nem o devedor a pagar, por partes, se assim não se ajustou." (grifou-se).
A doutrina é exata ao lecionar sobre o tema em debate:
"Como o credor pode exigir o cumprimento da obrigação, não pode ser compelido a aceitar prestação diversa da ajustada.
A prestação deve ser cumprida por inteiro, não se obrigando o credor a recebê-la por partes só porque ela se apresenta, por natureza, divisível, isto é, poderia até ser fracionada, mas assim não foi previamente estabelecido pelos interessados." (LISBOA, Roberto Senise. Manual de direito civil, Obrigações e Responsabilidade Civil, 3.ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004, v. 02, p. 137). (grifou-se).
Assim sendo, não logrou êxito o apelante em comprovar suas assertivas as quais atestam que o apelado contratou para receber em sucessivas prestações mensais, conforme preconiza o art. 333, I, do CPC.
"Art. 333. O ônus da prova incumbe:
I – ao autor, quanto ao fato constitutivo do seu direito.
[...]"
Sobre o tema, lecionam Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart:
"A regra estampada no art. 333 é bastante simples, e recorre a paradigmas já consolidados no direito processual. O ônus da prova incumbe a quem alega (ou, mais precisamente, a quem tem o ônus de alegar). Assim, incumbe ao autor demonstrar os fatos constitutivos de seu direito, cabendo ao réu comprovar as exceções indiretas, ou seja, os fatos modificativos, extintivos ou impeditivos do direito do autor." (Manual de Processo de Conhecimento – a tutela jurisdicional através do processo de conhecimento, 2. ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, p. 310).
Além disso, apenas a titulo argumentativo, verifica-se que, mesmo o apelado sendo beneficiário da assistência judiciária gratuita por se tratar de pessoa humilde e sem condições de arcar com as custas da demanda, não é admissível para a conduta padrão do homem médio e diante da boa-fé contratual, aceitar que o apelado contratou para receber o valor de R$ 25.000,00 (vinte e cinco mil reais) em prestações mensais de R$ 300,00 (trezentos reais) como aduz o apelante. Salienta-se, ainda, que tais encargos estão destituídos de qualquer acréscimo monetário, o que invalida ainda mais a sua existência. Do simples cálculo aritmético, constata-se que, se assim o fosse, para o apelado receber o montante total do contratado, haveria de ocorrer 83 (oitenta e três) prestações mensais, totalizando um período contratual de quase 7 (sete) anos.
Assim sendo, conquanto tenha sido repassado os valores dos pagamentos diretamente à esposa do apelado e a sua pessoa, tais recibos acostados na exordial não obstam a comprovação de que o pagamento do saldo remanescente do imóvel alienado deveria ser efetuado, conforme a nota promissória dada em garantia, diretamente em pecúnia, até o dia 25.10.2003.
Desse modo, partindo da premissa de que os argumentos defendidos pelo apelante vão de encontro à prova dos autos, não merece prevalecer a tese de que o pagamento do saldo remanescente (R$ 25.000,00) deveria efetivar-se em prestações mensais e sucessivas de R$ 300,00 (trezentos reais) cada, porquanto a quitação total deveria se dar na data de vencimento da nota promissória.
Destarte, diante do quadro apresentado, nega-se provimento ao apelo, mantendo-se incólume a decisão desafiada que julgou improcedente o pedido articulado na exordial.
III - DECISÃO:
Nos termos do voto da relatora, decide a Câmara, à unanimidade, negar provimento ao recurso, no sentido de manter incólume a decisão desafiada que julgou improcedente o pedido articulado na exordial.
Participaram do julgamento os Exmos. Srs. Desembargadores Fernando Carioni e Marcus Túlio Sartorato.
Florianópolis, 15 de maio de 2007.
Fernando Carioni
PRESIDENTE COM VOTO
Salete Silva Sommariva
RELATORA